Como Identificar os Riscos nas Operações de Crédito e Reduzir a Ameaça da Inadimplência

Geralmente, as operações de crédito são resumidas a empréstimos bancários, financiamentos, desconto de títulos. Entretanto, na realidade, a “concessão” de crédito ocorre diariamente em todos os negócios de diversas modalidades.

As compras “parceladas” realizadas representam o melhor exemplo da concessão de crédito no ambiente bancário, realizadas tanto pelas maiores plataformas online internacionais quanto pelas pequenas lojas de bairro, prestadores de serviços, dentre outros negócios.

Todas essas operações têm em comum as modalidades de risco que devem ser de conhecimento de quem “concede” crédito, independente do tamanho, modalidade, prazo ou valor.

Compreender e identificar esses riscos é crucial para uma gestão financeira eficaz e para reduzir as perdas, especialmente com a inadimplência. Os riscos mais comuns em operações de crédito incluem:

Risco de Crédito (ou Risco de Inadimplência): É o risco de o tomador de crédito não cumprir com suas obrigações de pagamento (principal e juros) conforme o acordado. Este é, sem dúvida, o risco mais crítico para o credor.

Risco de Mercado: Refere-se à possibilidade de perdas devido a flutuações nas taxas de juros, câmbio, preços de commodities ou ações. Por exemplo, uma alta inesperada na taxa de juros pode encarecer o financiamento para o tomador, aumentando o risco de inadimplência.

Risco de Liquidez: É o risco de o credor não ter recursos suficientes para honrar seus compromissos financeiros no curto prazo, ou de ter que vender ativos a preços desfavoráveis para obter liquidez. Para o tomador, o risco de liquidez se manifesta na dificuldade de conseguir crédito no mercado, mesmo que ele seja solvente.

Risco Operacional: Envolve perdas resultantes de falhas em processos internos, sistemas, pessoas ou de eventos externos. Isso pode incluir erros na análise de crédito, fraudes, falhas nos sistemas de pagamento, etc. Aqui estão incluídas as “modalidades” comuns de fraude e as “brechas” tecnológicas.

Risco Legal e Regulatório: Surge da possibilidade de perdas devido às mudanças na legislação, regulamentação ou disputas legais. Um exemplo seria uma nova lei que altere as condições de cobrança de dívidas, como recentemente observado na alteração da prescrição intercorrente de cobranças ajuizadas.

Risco de Reputação: Embora não seja um risco financeiro direto, a má gestão de operações de crédito (por exemplo, alta taxa de inadimplência ou práticas de cobrança abusivas) pode prejudicar a imagem e a confiança na instituição ou empresa. Casos clássicos apareceram recentemente na mídia de empresas que tiveram problemas com crédito, envolvendo quase todos os principais agentes do mercado de crédito.

É importante adicionar os riscos jurídicos, representados pelas medidas ajuizadas pelos tomadores para discutir o crédito, como, por exemplo, revisionais de contratos, pretensões indenizatórias, recuperação judicial de empresas, pedidos de falência, dentre outros.

Como Identificar os Riscos

A identificação dos riscos passa por uma análise criteriosa e contínua do perfil do tomador, das características da operação e do cenário econômico, podendo ser basicamente descritas algumas medidas a seguir:

Histórico de Crédito: Consultar bureaus de crédito (SPC, Serasa) para verificar o histórico de pagamentos, dívidas anteriores, protestos e ações judiciais.

Capacidade de Pagamento: Avaliar a renda do tomador (individual ou empresarial) em relação às suas despesas e outras dívidas. Analisar o fluxo de caixa para empresas.

Endividamento: Verificar o grau de endividamento atual do tomador. Um grau elevado de alavancagem é um sinal de alerta.

Garantias: Avaliar a qualidade e o valor das garantias oferecidas (se houver), especialmente a titularidade e se não há a averbação de outras dívidas.

Setor de Atuação (para empresas): Entender a saúde do setor em que a empresa opera, sua sensibilidade a ciclos econômicos, sazonalidade e a concorrência.

Importante destacar que o monitoramento contínuo dessas condições é essencial, pelo menos durante o período de vigência da operação de crédito.

Acompanhamento da Saúde Financeira: Para empresas, acompanhar demonstrações financeiras (balanço, DRE), fluxo de caixa e indicadores econômicos. Para pessoas físicas, monitorar mudanças na situação empregatícia ou de renda.

Notícias e Eventos: Ficar atento a notícias que possam afetar o tomador de crédito ou o setor de atuação.

Comportamento de Pagamento: Observar qualquer alteração no padrão de pagamentos, mesmo que ainda não seja um atraso formal.

Consultas Públicas: Acompanhar, por meio de pesquisas periódicas, eventuais alterações nos dados cadastrais do tomador, a emissão de certidões fiscais, de protestos, alteração de processos em que o tomador é parte.

Indicativos de Proximidade à Inadimplência

A capacidade de identificar os sinais precoces de que um tomador de crédito está se aproximando da inadimplência é fundamental para mitigar perdas. Alguns indicativos podem demonstrar o potencial da inadimplência.

Os atrasos pontuais e frequentes nos quais o tomador começa a atrasar pagamentos por alguns dias, mas ainda consegue quitar a dívida são sinais de alerta. Com o tempo, esses atrasos podem se tornar mais longos e frequentes.

O pagamento mínimo das faturas em cartões de crédito, ainda que difíceis de consultas, pode começar a sinalizar ausência de recursos. Para dívidas rotativas, como cartões de crédito, pagar apenas o valor mínimo indica dificuldade em honrar o valor total da fatura.

A renegociação de dívidas existentes, nas quais o tomador busca renegociar outras dívidas que possui no mercado, parcelando-as ou estendendo prazos, representam sinais claros de pressão financeira.

A utilização excessiva de limites de crédito, sem a contrapartida de investimentos no negócio, sendo que o tomador utiliza constantemente o limite máximo disponível em suas linhas de crédito, sejam elas cheque especial ou cartão de crédito, sinalizam atenção.

Quando verificado nos relatórios de bureaus de crédito, consultas recorrentes a crédito em um curto período por diferentes instituições financeiras, pode indicar que o tomador está desesperadamente buscando mais crédito para cobrir dívidas de curto prazo ou rolar dívidas.

Nos casos em que há dificuldade de comunicação, quando o tomador passa a evitar o contato, não retorna chamadas ou e-mails, ou se mostra evasivo em suas respostas, é importante redobrar a atenção.

As alterações no comportamento financeiro, especialmente para as empresas, quanto ocorre a queda imprevisível no faturamento, aumentando despesas, demissões de funcionários, fechamento de filiais ou reclamações de clientes/fornecedores, são indícios de problemas futuros.

Obviamente, a existência de protestos e medidas judiciais, ou seja, quando são identificados registro de novos protestos em cartório ou o ingresso de ações judiciais de cobrança ou de outra natureza na qual o tomador atua no polo passivo, demonstra sinais graves de deterioração financeira.

O histórico de reiteradas renegociações anteriores envolvendo dívidas no passado e dificuldades recorrentes pode indicar um padrão de comportamento de risco.

Como Prevenir ou Antecipar a Inadimplência e Reduzir Perdas

A prevenção e a antecipação são as melhores estratégias para reduzir os impactos da inadimplência, sendo importante realizar a análise de crédito rigorosa, completa e atualizada antes de conceder qualquer crédito, utilizando todas as ferramentas disponíveis (bureaus de crédito, análise de demonstrações financeiras, histórico de relacionamento).

Além disso, a definição de políticas de crédito claras, mediante a previsão de critérios bem definidos para a concessão de crédito, incluindo limites, prazos, taxas de juros e garantias exigidas, dentre outros critérios conforme a característica e objetivos do credor, podem ajudar na prevenção da inadimplência.

Assim como a diversificação da carteira de crédito evitando concentrar o risco em poucos tomadores ou em um único setor da economia, aliada a instituição de garantias robustas e adequadas, para operações de maior risco ou valor, como garantias reais (imóveis, veículos) ou fidejussórias (aval, fianças bancárias) que cubram o valor da dívida.

Os instrumentos nos quais devem constar cláusulas contratuais robustas, incluindo cláusulas de vencimento antecipado em caso de inadimplência de outras dívidas, falência, ou descumprimento de outras obrigações, são importantes especialmente nas discussões judiciais.

Além disso, a educação financeira (para o tomador) para agentes de varejo, prestando orientações sobre orçamento e uso consciente do crédito, pode reduzir o risco de endividamento excessivo.

Quanto à antecipação e redução de perdas, algumas ferramentas, como monitoramento ativo e contínuo, compreendendo um acompanhamento constante do comportamento de pagamento dos seus clientes, utilizando sistemas de alerta que sinalizem atrasos ou alterações no perfil de risco, são aliados.

Contar com profissionais experientes e eficientes para ajudar na criação e acompanhamento de uma política de cobrança eficaz, através do desenvolvimento de um processo de cobrança estruturado, com diferentes etapas (contato inicial, lembretes, negociação, etc.) reduz significativamente os efeitos da inadimplência, agindo rapidamente, mas com ética.

É essencial criar provisões para devedores duvidosos, permitindo que a empresa absorva as perdas esperadas sem comprometer sua saúde financeira, e da mesma forma, quanto às medidas judiciais para a recuperação desses créditos que são utilizadas após exaurirem as tentativas de negociação, representam o próximo passo para tentar reaver o crédito.

Finalmente, atualmente é possível vender as carteiras de crédito inadimplentes, em alguns casos, para entidades especializadas em recuperação de dívidas, distressed assets, como, por exemplo, Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios – FIDCs – mesmo que com deságio.

Acompanhar os riscos de crédito exige uma abordagem multifacetada, combinando análise rigorosa na concessão, monitoramento constante e estratégias eficazes de recuperação, bem como experiência e capacidade técnica para evitar ou reduzir a inadimplência.